um ano viajando de bicicleta

No primeiro dia da viagem, saí em silêncio. Três pessoas me viram partir. Fazia um leve frio – desses das manhãs de Goiás. A cidade ainda dormia. Saí meio desequilibrado guiando minha nova casa, carregando tudo o que eu tinha em alguns alforjes. Quarenta e quatro quilômetros depois, eu chegava em Piracanjuba.

De repente eu estava em outro estado. Era Minas. Depois era São Paulo. E São Paulo também passou. Atravessei ilhas para chegar no Paraná. Sempre com a minha bicicleta. Entrei em Santa Catarina enfrentando um frio que não estava acostumado, conhecendo pessoas incríveis e provando comidas que nem sabia que existiam. Eu vi o oceano e o bioma que não chegam em meu Estado, balneários, cabos, faróis, cânions. Conheci a Andry.

Fui me transformando ao longo da jornada. E isso não quer dizer que melhorei, só que mudei. Eu pedalava rápido e de maneira intensa, hoje quero aproveitar os lugares na velocidade de um caracol. Antes eu ligava para o oceano, agora eu ligo para o córrego. Escrevia e publicava meus relatos com urgência de rede social, agora meu caderninho tem mais caligrafia torta e mais sujeira de grafite.

Minhas preocupações diárias passaram a ser as mais básicas e basais: comer, beber água e me aquecer. Sem boletos e ligações bancárias, sem ter que arrumar a torneira da cozinha. Sem despertador. Sem alguém me perguntando da dissertação do mestrado. Sem rotina. Todos os dias: comer, beber água e me aquecer.

Outro dia eu vi um condor. Outro dia eu vi pinguins. Outro dia um pica-pau de cabeça vermelha. Uma aranha na grama. Um dia eu vi capivaras, jacarés. E pensar que bastou sair de bicicleta para que tudo isso acontecesse. As coisas são mais detalhadas, mas elas não deixam de ser simples. Simplesmente saí.

Texto escrito no dia 24 de janeiro de 2023


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