Notas do dia 273. Hoje a barraca amanheceu com uma fina camada de gelo. Estamos há oito dias seguidos acampando e há cinco sem banho. Ainda estamos cheirosos – é bom pensar assim. Saímos de Villa La Angostura para fazer o Circuito dos Sete Lagos. É o trecho mais lindo que já percorri. As curvas da Ruta 40 revelam paisagens, fico perdido e não sei para onde olhar.
Dormindo às margens de lagos rodeados de montanhas congeladas é mais difícil de lavar a louça do café. Ou de escovar os dentes. Mas hoje a barraca amanheceu quebradiça. Faz muito frio pela manhã e os primeiros raios de sol só chegam às 10h na nossa lona laranja. Saí para organizar os alforjes nas bicicletas e bati com a cabeça em um tronco. Só um susto. Andry fez o curativo. Ainda temos que pedalar para chegar a San Martin. Os Andes estão olhando.

Todas as manhãs eu fico apavorado. Questiono se estou no caminho certo. Mas isso ocorre há uns dez anos. Pelo menos agora eu estou caminhando. O Brunno de hoje não convidaria o Brunno de janeiro para uma cerveja – talvez o Brunno de amanhã convide. Sigo acreditando no olho, não no olhar. Está frio. Aqui na Patagônia os lagartos são pequenos e os quero-queros são ligeiramente mais robustos. Todos os olhos da aranha peluda que encontramos outro dia falam a verdade (para citar Thoreau de uma maneira diferente).
Texto escrito no dia 23 de outubro de 2022